Petrobras (PETR4) respira após crise dos dividendos: interferência política já causou estragos históricos na Bolsa; relembre casos

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No último 7 de março, a Petrobras (PETR4) protagonizou um daqueles dias que marcam a memória do investidor brasileiro. A companhia comunicou o repasse de R$ 14,2 bilhões em dividendos mínimos trimestrais, sem anunciar o esperado pagamento dos dividendos extraordinários. Isso acabou provocando uma crise no governo que abalou o mercado. Jornais informavam que, por trás da ausência dos proventos, estava a interferência política do Executivo nos rumos da petroleira.

A turbulência aparentemente se encerrou nesta quinta (25), com o anúncio de 50% dos dividendos extras retidos e promessa de pagamentos similares até o fim do ano.

Em março e até a primeira quinzena de abril, a Petrobras perdeu bilhões em valor de mercado e as ações sofreram no Ibovespa (os papéis PETR4 tiveram queda em dez pregões, mas acabaram fechando com março com leve alta de 0,3%). A baixa começou desde que se soube que o conselho da administração da Petrobras, controlado majoritariamente pelo governo, havia vetado a proposta trazida pelo presidente Jean Paul Prates para pagar 50% dos R$ 43,9 bilhões referentes ao lucro do exercício de 2023 em dividendos extraordinários aos acionistas. Pesaram para as ações declarações do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, criticando a distribuição de dividendos da Petrobras.

A reação do mercado no dia seguinte foi brutal, tendo a queda das ações ordinárias e preferenciais da empresa significado o esfacelamento de mais de R$ 55 bilhões na sua capitalização.

Desde então, quase dois meses se passaram e só agora as ações da Petrobras voltam a negociar a patamares próximos do que se observava no início de março — uma consequência também do aumento do preço do petróleo e da posição de recuo do governo.

Prates quase perdeu o cargo, em meio à crise entre o CEO da Petrobras e o ministro das Minas e Energia Alexandre Silveira. O ministro da Fazenda Fernando Haddad intercedeu e conseguiu emplacar a tese de que a estatal, empresa de capital aberto e com autonomia para tomar sua decisões, deveria distribuir os dividendos da Petrobras.

Para Wendel Finotti, CEO e fundador da Meu Dividendo, porém, apesar da recuperação vista no mercado, paira sobre a Petrobras um viés de desconfiança. Isso porque a companhia não cumpriu o que indicou ao mercado no Plano de Remuneração aos Acionistas, divulgado em julho de 2023.

“Quando a Petrobras não paga os dividendos extraordinários, contrariando o que havia sido anunciado pela própria companhia no ano passado, acaba se justificando o estranhamento [do mercado]. O investidor gosta de previsibiliddade”, conclui Finotti. 

A posição favorável de Prates à distribuição de dividendos extras da Petrobras quase lhe custou a paz no cargo porque os conselheiros indicados pelo governo Lula defendiam maior disponibilidade de recursos para investimentos da Petrobras, seja em projetos de transição energética, seja na reabilitação de refinarias abandonadas, como a de Abreu e Lima (RNEST). 

Plano Estratégico da Petrobras, aprovado para o quinquênio 2024-2028, mostra que a empresa pretende investir US$ 30 bilhões em 5 anos, um crescimento de 31% em relação ao ciclo anterior. 

De acordo com Frederico Nobre, analista da Warren Investimentos, o aumento do capex compromete a capacidade da Petrobras de pagar dividendos no patamar que a tornava uma boa tese de investimento no segmento de óleo e gás. 

“Desmontamos essa posição em dezembro de 2023, mirando preocupações com o Plano Estratégico”, diz Nobre. Para o analista, outra dúvida que paira no plano de investimentos da empresa, e que justifica uma visão neutra sobre o papel, é a viabilidade financeira dos novos investimentos em refino e descarbonização.

“Qual é a taxa de retorno esperada pela Petrobras? A exploração do pré-sal é muito rentável para a companhia. Por outro lado, a empresa prevê retornos reais [acima da inflação] de 8% nos outros segmentos que atua, o que nós consideramos muito baixo”, pontua Nobre.

Nobre e Finotti concordam que a questão envolvendo a política de dividendos revela as contradições de uma empresa que tenta servir, ao mesmo tempo, interesses da União e de acionistas do mercado. 

A Petrobras, aliás, possui um extenso histórico de desavenças entre minoritários e interesses do governo brasileiro. Confira as últimas quatro vezes em que interferências do governo causaram tombos épicos no valor da empresa. 

Mudanças no estatuto social da Petrobras (outubro de 2023, governo Lula)

No dia 23 de outubro de 2023, já sob a gestão Prates, a Petrobras comunicou ao mercado que o Conselho de Administração revisaria a política de indicação de membros do alto escalão, excluindo vedações previstas pela Lei das Estatais, de 2016. 

O argumento usado pela empresa apontava para uma liminar concedida pelo então ministro do STF Ricardo Lewandowski, hoje ministro da Justiça, em março do ano passado. Na decisão, Lewandowski suspendeu restrições que impediam a nomeação de diretores ou conselheiros que tivessem atuado, nos três anos anteriores, em órgãos de decisão de partidos políticos ou em campanhas eleitorais. 

A reação dos investidores à flexibilização das regras de nomeação foi tempestuosa, contratando um tombo de 6% dos papéis da Petrobras e uma perda de R$ 32 bilhões na capitalização de mercado da companhia.

A alteração foi enfim consumada com a mudança do estatuto social da empresa no dia 30 de novembro, apesar do protesto dos acionistas minoritários que chegaram a contestar a medida no STF, mas não obtiveram sucesso em reverter a medida.

“Não tem quem não tenha ficado chateado com o aumento” (fevereiro de 2021, governo Bolsonaro)

 Em fevereiro de 2021, a Petrobras chegou a perder cerca de R$ 102,5 bilhões em capitalização de mercado ao longo de dois pregões consecutivos – a segunda maior queda da história da empresa na Bolsa brasileira.

O então presidente Jair Bolsonaro expressou descontentamento com a  decisão da companhia em reajustar o valor de derivados do petróleo, em acordo com a antiga política de preços da Petrobras — o PPI. 

Ocorre que o aumento dos preços dos combustíveis, no momento mais agudo da pandemia de Covid-19 no Brasil, também havia se tornado um problema de popularidade para o presidente.

O estopim da crise aconteceu quando o então presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, disse não ser um problema da empresa a ameaça de uma greve de caminhoneiros, o que irritou Bolsonaro. 

Castello Branco foi então exonerado do cargo. Em seu lugar, assumiu o general Joaquim Silva e Luna. A pressão por preços mais baixos nos combustíveis faria ainda dois sucessores.

O fantasma de greve de 2018  (abril de 2019, governo Bolsonaro)

O temor de que o aumento dos combustíveis pudesse levar a uma greve ampla de caminhoneiros – como ocorrida um ano antes – atormentava Bolsonaro desde antes da pandemia. 

Em abril de 2019, após saber que a Petrobras havia reajustado o preço do diesel em 5.7%, Bolsonaro ligou para Castello Branco para suspender o repasse.

Isso ocasionou reação indigesta no mercado, e a empresa chegou a perder R$ 32,4 bilhões em valor de mercado ao fim de um pregão no Ibovespa. 

A errática política de controle de preços  (2011-2014, governo Dilma) 

O caso mais longo de interferência política na Petrobras ocorreu durante o primeiro governo de Dilma Rousseff (PT). 

Preocupada com o controle da inflação, a ex-presidente determinou que a estatal não repassasse aos consumidores o avanço do barril no mercado internacional, absorvendo a defasagem em forma de endividamento.

O controle dos preços permaneceu ao longo de quatro anos e gerou um passivo de R$ 72 bilhões, o que colocou a petroleira em uma posição financeira frágil

Segundo o balanço da própria companhia, a ingerência do governo Dilma na política de preços superou em mais de dez vezes o valor perdido com perdas patrimoniais vinculadas ao esquema de corrupção que ocorrera na companhia durante o mesmo período.

Ao fim dos seis anos do governo Dilma, as ações da Petrobras, maior petroleira da América Latina, caíram quase 90%.

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